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Levantamento feito pelo Departamento Intersindical de
Assessoria Parlamentar (Diap) mostra um aumento, na nova composição do
Congresso Nacional, do número de parlamentares ligados a segmentos mais
conservadores – entre eles, militares, policiais, religiosos e
ruralistas. Na avaliação do analista político do Diap, Antônio Augusto
de Queiroz, este será “o Congresso mais conservador desde a
redemocratização”.
Para o especialista, “algumas conquistas do processo civilizatório, como
a garantia dos direitos humanos, podem ser interrompidas ou mesmo
regredir com a eleição de uma bancada extremamente conservadora”.
O Diap mostra crescimento do número de parlamentares policiais ou
próximos desse segmento, como apresentadores de programas de cunho
policialesco. Ao todo, esse setor contará com 55 deputados, parte dos
quais defendeu, na campanha, a revisão do Estatuto do Desarmamento, a
redução da maioridade penal e a criação de leis mais rígidas para punir
crimes.
Com foco no discurso sobre segurança, o delegado da Polícia Federal
Moroni Torgan (DEM) foi o candidato a deputado federal mais votado do
Ceará, com 277.774 votos. Em seus programas no horário eleitoral
gratuito, ele pedia uma legislação mais rígida. “Já estamos cansados
dessa história, o bandido comete um crime e não passa um dia na cadeia.
Isso acontece por que a lei é fraca. Isso tem que mudar. Quem deve ter
medo das leis é o bandido e não a população.”
No Distrito Federal, o coronel da reserva da Polícia Militar Alberto
Fraga (DEM) foi o mais votado, com 155.056 votos. No Rio de Janeiro, o
atual deputado Jair Bolsonaro (PP), militar da reserva, foi o campeão de
votos no estado, com 464.418 votos e segue agora para o sétimo mandato
no Congresso Nacional.
Conhecido por suas declarações contra homossexuais e pelos embates na
Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, Bolsonaro deve ter
velhos e novos aliados na próxima legislatura.
A bancada evangélica - que teve em Marcos Feliciano (PSC), também
reeleito, representante de destaque na legislatura passada - também
cresceu e contará, agora, com 52 parlamentares.
Embora nem todos os evangélicos devam ser considerados conservadores, em
geral, eles têm tido postura contrária à ampliação do direito ao
aborto, à união homoafetiva e à legalização de drogas como a maconha.
O líder do Partido Republicano Brasileiro (PRB) na Câmara, George Hilton
(PRB-MG), partido que foi fundado por integrantes da Igreja Universal
do Reino de Deus, pondera que as posições não são novas e que esses
grupos já vêm ocupando a política institucional. “O país é plural, mas
ainda tem uma história muito conservadora. É de maioria cristã. É
natural que essa maioria defenda, no Parlamento, os ideais cristãos”,
aponta.
Defensor da família, o apresentador Celso Russomano (PRB-SP) foi o
deputado mais votado destas eleições. Com 1,5 milhão de votos, ele
ajudou a dobrar a bancada do PRB, que passou de oito para 21 deputados
na Câmara. “Vai existir nessa Casa um grande embate em relação a esses
direitos [humanos]”, avalia Hilton, para quem o partido não deve
combater, mas sim defender políticas públicas para as mulheres e outros
segmentos.
Já o setor identificado com a defesa dos direitos humanos perdeu
parlamentares com longo histórico de atuação na área, como Nilmário
Miranda (PT-MG), Domingos Dutra (SD-MA) e Iriny Lopes (PT-ES), que não
foram reeleitos. Por outro lado, lideranças como Érika Kokay (PT-DF),
Jean Wyllys (PSOL-RJ) e Chico Alencar (PSOL-RJ) ganharam nas urnas e
figuraram no grupo dos mais votados de cada estado.
Para o integrante da coordenação da Plataforma de Direitos Humanos
(Dhesca Brasil) Darci Frigo, houve uma mescla entre “o fenômeno de
conservadorismo, mas com influência decisiva do poder econômico”. Para
garantir equidade no pleito, ele defende a limitação da atuação das
empresas nas eleições, por meio de uma reforma política.
Embora aponte que as avaliações são preliminares e que o comportamento
do Parlamento dependerá do resultado das eleições presidenciais, Frigo
assinala que “os setores mais vulneráveis da sociedade poderão sofrer
ataques fortíssimos”. No centro das atenções, de acordo com ele, estão
as questões relacionadas aos povos indígenas.
Segundo o Diap, nenhum dos candidatos que se autodeclarou indígena foi
eleito para a Câmara dos Deputados. Além disso, dois dos que integram a
Frente Parlamentar em Defesa dos Povos Indígenas não voltarão à Câmara:
Padre Ton (PT-RO), que perdeu a eleição para o governo de Rondônia, e
Domingos Dutra (SD-MA), que não conseguiu ser reeleito.
Já a bancada ruralista deve crescer, segundo a Frente Parlamentar da
Agropecuária, que reúne os representantes do setor. Hoje composta por 14
senadores e 191 deputados, a frente estima que passará a contar com 16
senadores e 257 deputados.
“O ataque principal vai ser ao conjunto de direitos dos povos indígenas,
em especial os ligados à questão fundiária”, afirma o secretário
executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber Buzatto.
Propostas de emenda à Constituição e projetos de Lei sobre o tema já
tramitam e têm gerado resistência por parte desses povos.
Diante do atual cenário, “nós vamos continuar apoiando a incidência
direta dos povos indígenas, que não têm representação na Câmara e no
Senado, mas que têm feito intervenções diretas por meio de delegações,
ao mesmo tempo que procuraremos deputados e senadores que se identificam
com a causa e também aqueles que não têm vínculo orgânico com o
latifúndio para pedir o apoio para que não haja retrocessos”, antecipa
Buzatto.
No caso das mulheres, o problema é a sub-representação. A bancada
cresceu 10%, conforme o Diap. Foram eleitas 51 mulheres, cinco a mais do
que as 46 que ganharam as eleições em 2010. Pouco, na avaliação do
departamento.
Antônio Augusto de Queiroz opina que, para reverter a situação, seriam
necessárias políticas efetivas de valorização das candidaturas
femininas, como a priorização das mulheres na distribuição do tempo de
televisão e garantia de recursos financeiros.
O levantamento do Diap mostra também que a bancada de parlamentares
vinculados à defesa dos trabalhadores, como os advindos do movimento
sindical, sofreu diminuição. Dos 83 deputados da legislatura anterior,
restaram apenas 46, dos quais 14 são novos e 32 foram reeleitos.
O setor empresarial, por sua vez, vai contar com 190 deputados, segundo
levantamento parcial do departamento. Em 2010, esse segmento elegeu 246
representantes.
De acordo com o analista do Diap, a diferença no tamanho das bancadas
pode levar a retrocessos em relação aos direitos trabalhistas, já que o
setor empresarial pode fortalecer a defesa da regulamentação da
terceirização “em bases precarizantes, da substituição do legislado pelo
negociado, permitindo que os sindicatos possam negociar redução de
direitos, e do projeto do chamado Simples Trabalhista, que pode criar um
trabalhador de segunda categoria, com menos direitos”, avalia.
Para a socióloga e professora da Universidade de Brasília (UnB) Débora
Messenberg, que estuda o Parlamento brasileiro, as diferenças nas
representações dos distintos grupos sociais e “a questão central que
passa pela ampliação da pulverização dos partidos é decorrência da não
realização da reforma política”, defende.
Embora o tema tenha sido alvo dos protestos de junho de 2013 e,
inclusive, de propostas da presidenta Dilma Rousseff, a reforma não
andou. Dentre as consequências disso, segundo a especialista, estão a
manutenção do financiamento privado das campanhas e o distanciamento dos
jovens da política.
“Os jovens não estão interessados na política institucional, e isso fez
com que muitos deles votassem nulo ou branco. Um voto que, na prática,
funciona como abertura de espaço para quem está no jogo”, cita a
socióloga, destacando que abstenções, votos nulos ou brancos somaram
cerca de 29% do total aferido no primeiro turno destas eleições. Os
percentuais relativos aos votos que não entram nas contas dos votos
válidos aumentaram nas três modalidades.
Para Débora, “a reforma política não vai sair do Congresso”. “Não teve
em Congressos menos conservadores, muito menos agora”. Ela aposta que a
mudança deverá ser fruto da pressão da sociedade e da atuação do
Executivo.
Fonte:
Agência Brasil