Imagem: Amab/OAB |
Celebrado nesta sexta-feira (20), o Dia da
Consciência Negra é data que atenta para o fato de que o espaço destinado aos
negros no Judiciário baiano ainda é restrito, mesmo no estado com a maior
população afrodescendente fora da África. Esta é a avaliação de dois
desembargadores ouvidos pelo Bahia Notícias na tarde desta sexta.
Para
Ivanilton Santos da Silva, empossado no cargo no último dia 16 de outubro no
Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), a presença de negros no mais alto escalão
da Corte “ainda é muito pequena e aquém das expectativas”. Silva destaca que,
dentro de um universo de 54 desembargadores que compõem o órgão, ele é um dos
apenas dois magistrados negros – o outro é Luiz Fernando Lima – a ocupar o
cargo. “Só temos dois efetivamente negros. Desses que realmente olham para o
espelho e dizem: ‘eu sou negro’. Outros dizem: ‘eu não sou tão negro, sou quase
branco”. “Dois num universo de 54? Na Bahia? Uma coisa que nos deixa
horrorizado. É uma desproporção enorme”, lamenta.
Originário de família humilde, composta por
mais seis irmãos e filho de mãe professora primária e pai eletricista, Silva
estudou a vida inteira em escola pública e foi aprovado no vestibular para a
Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia (Ufba) em 1966. Aprovado
em terceiro lugar no concurso para juiz de direito, exerceu a magistratura de
1981 até alçado em 2015 ao cargo de desembargador. Revela nunca sido vítima de
situações explícitas de preconceito racial, mas ter passado por momentos de
discriminação “velada”. “Ao entrar no meu gabinete, algumas pessoas se
espantavam e perguntavam: ‘o senhor é o juiz?’ Se eu
estou sentado na mesa de juiz e têm alguns processos na minha frente, eu sou o
juiz”, conta.
O desembargador destaca conquistas, como os 30% de cotas para negros
em concursos para magistrado e servidor público na Corte, mas avalia que é
necessário mais. “Apoio atitudes como esta que garantiu cotas para dar acesso
aos negros no serviço público. A situação é melhor, andamos um pouquinho, mas
estamos muito aquém das necessidades. É preciso fazer algo para proporcionar
mais chances”, pontua.
Já o desembargador Esequias Pereira de
Oliveira, também vindo de família pobre, foi um dos únicos da família a
conseguir ingressar na Faculdade de Direito da Ufba, em 1971. Vindo do
município de Cruz das Almas, no Recôncavo Baiano, e filho de pai operário e mãe
doméstica, Oliveira nunca teve acesso ao ensino privado, mas, mesmo com as
dificuldades, desembarcou em Salvador para cursar direito e se formou em 1981.
Desembargador do Tribunal Regional do Trabalho da Bahia (TRT-BA) desde 2002,
ele afirma nunca ter sofrido preconceito dentro da Corte e diz enfrentar de
forma diferenciada o assunto. “Não há nenhuma discriminação pelo fato de ser
negro, mas não percebo isto. “Acho que pode haver resquícios de práticas
discriminatórias, mas ela não se manifesta. São comportamentos travestidos de
práticas não identificáveis”, afirma.
Segundo ele, o TRT-BA avançou no combate ao
racismo. “Não há uma posição de discriminação nem positiva nem negativa. O
Tribunal tem uma postura mais retilínea e de punição. Apesar de não identificar
racismo na Corte, o desembargador avalia a sociedade brasileira como
“naturalmente racista”. “A escravidão deixou marcas profundas. O negro não é
integrado e não projetado na sociedade brasileira. Alguns negros, como eu, que
tiveram oportunidade, janela, se projetaram na sociedade e aparecem como uma
espécie de joia na sociedade. Eu aplaudo os mecanismos de punição do racismo e
discriminação”, declara.
Fonte: Bahia Notícias