Opinião: As notícias e os dias

Imagem: Ilustrativa | Elesbão News
Por Sergio Marcone Santos
“Juizeco”, Samarco-um-ano, PEC 241, ocupações, Cunha preso, desemprego, reforma da Previdência.

Às vezes penso no leitor do século 19 que acompanhava o desdobrar dos acontecimentos lendo as histórias divulgadas semanalmente nos jornais. Elas tinham um sabor romanceado.

Imaginem os casos de estupro e morte de Jack, “O Estripador”, na Inglaterra. Aquilo deveria ser, antes de tudo, motivo de buxixo, das várias conversas de comadres e compadres nas estalagens, nos pubs etc.

Nossas histórias de hoje possuem um “realismo” tão forte que parece que a todo instante somos transplantados para um pesadelo. Cada vez que abro os sites de notícias, a sensação é a de que estamos mergulhados num caos absoluto.

Outra coisa diz respeito ao museu de grandes novidades. A corrupção é mais velha que andar para frente, mas tal a quantidade de valores de dinheiro e ao enraizamento em nossa cultura que, ou nos choca ao vir alguém roubar de empréstimos consignados, ou se banaliza quando se fala de corrupção em estatais.

Há aquelas pessoas, que para o bem ou para o mal, preferem ignorar solenemente as notícias. Isso funciona até certo ponto, porque se o fato de ignorar nos isentasse de pagar a conta, estaria tudo perfeito. Ignorando ou não, os estupros em forma de corrupção, desemprego, enfim, descalabros mil sempre recaem sobre os ombros dos mais fracos.

Outra forma de evitar essa enxurrada de más notícias vindas de todos os lados é abstrair e ver a última fofoca daquele artista. Sinceramente, pergunto: isso ainda interessa a alguém? Os escândalos daquela(e) star é o mesmo vivido por aquele seu vizinho ou colega de trabalho. Traições, barracos, drogas nós temos em todos os cantos e em todos os lugares. No máximo, é o tipo de notícia que dura algumas horas, quiçá um dia, e morre.

Nos anos 1980, o programa de rádio de maior audiência em Feira de Santana, o “Ronda Policial”, apresentado por Francisco Almeida  e Agnaldo Santos (cognominados Pirunga e Categó) eletrizou a cidade com a história do “motoqueiro da moto vermelha”. Esse jovem abordava mulheres e as molestava. Acompanhávamos os desdobramentos de investigação e dos sempre crescentes casos que apareciam em todos os cantos da cidade. Ouvíamos maravilhados entre o horror e a catarse que a violência nos provoca (coisas do tipo: é sempre bom ver alguém mais violento que nós; ou a narrativa ficcionalizada dos radialistas que se aproximavam das rádio-novelas da Era de Ouro do rádio).

Hoje, surgiu outra figura. Dessa vez com uma seringa. As primeiras vítimas já apareceram aqui e acolá. Só que nesse combalido século 21, em que (quem diria) ressuscitaram até a Guerra Fria, esse caso possui só a característica do horror, do abjeto.

É como se tivéssemos perdido a inocência no qual acompanhar tal caso equivalesse a ver o último capítulo da novela.

Se formos inoculados com algum vírus através desse maníaco, podemos pegar uma doença horrível, sofrer em hospital público e morrer, logo pensamos.

É um realismo trágico que torna o dia-a-dia um sonho ruim. Um sonho que parece interminável, do tamanho da existência.

As notícias pulam das telas e invadem nosso mundo que outrora pensáramos imune a coisas tão feias. Mas buscamos por isso. Tanto chamamos a realidade para conviver em nosso cotidiano, através de uma vida na qual mandamos embora a imaginação legada pela Literatura e a boa música (dentre outros), que agora ela se incrustou e não quer mais arredar pé.

Tomara que o despertador toque e acordemos desse pesadelo.

Sergio Marcone Santos é formado em Letras Vernáculas pela Uefs e pós-graduando em Comunicação em Mídias Digitais pela Unifacs.
 
*As opiniões emitidas em artigos assinados no site Diário da Notícia são de inteira e única responsabilidade dos seus autores.
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