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A Polícia Federal identificou em e-mails trocados por funcionários da Vale e da consultoria alemã Tüv Süd que a empresa de mineração já sabia de problemas com sensores da barragem do Córrego do Feijão, em Brumadinho (MG) dois dias antes do rompimento que matou 150 pessoas e deixou 182 desaparecidos.
As informações constam do depoimento do engenheiro Makoto Namba, coordenador de projetos da empresa Tüv Süd, à PF.
Namba e outro engenheiro, André Yassuda, foram presos no dia 29 de novembro, quatro dias depois do estouro da barragem que despejou o mar de lama em Brumadinho. Nesta terça, 5, o Superior Tribunal de Justiça mandou soltar os dois engenheiros.
O delegado Luiz Augusto Nogueira leu os e-mails para o engenheiro durante seu depoimento. Segundo a PF, as mensagens “foram iniciadas pelo indivíduo Denis Valentim no dia 23 de janeiro de 2019, às 14h38” e endereçadas a executivos da Vale a da Tüv Süd. No dia 24 de janeiro, às 14h44, funcionários da terceirizada Tec Wise também receberam mensagens.
“(O) assunto tratado diz respeito a dados discrepantes obtidos através da leitura dos instrumentos automatizados (piezômetros) no dia 10 de janeiro de 2019, instalados na barragem B1 do CCF, bem como acerca do não funcionamento de 5 piezômetros automatizados”, narrou a Polícia.
A PF questionou o engenheiro “qual seria sua providência caso seu filho estivesse trabalhando no local da barragem B1”.
“Respondeu que após a confirmação das leituras, ligaria imediatamente para seu filho para que evacuasse do local bem como que ligaria para o setor de emergência da Vale responsável pelo acionamento do PAEBM (Plano de Ação de Emergência para Barragens) para as providências cabíveis”, disse Makoto Namba.
Makoto Namba disse à PF que trabalha há 24 anos na Tüv Süd. Segundo o engenheiro, “a 1ª auditoria externa realizada pela Tüc Süd na Barragem do Córrego Feijão ocorreu em setembro de 2018 e consistiu na avaliação das condições da estrutura da barragem se seus dispositivos de segurança e dos dados referentes à mesma de inspeções anteriores bem como da revisão periódica realizada em junho de 2018”.
“A auditoria externa ou inspeção regular realizada em setembro de 2018 e os respectivos relatórios serviram como base para a declaração de estabilidade assinada pelo declarante em setembro de 2018 referente a barragem B1 do CCF”, contou.
De acordo com o depoimento, o engenheiro relatou ter ouvido uma frase “do funcionário da Vale de nome Alexandre Campanha”, durante uma reunião: “A Tüv Süd vai assinar ou não a declaração de estabilidade?”.
Namba declarou ter respondido: “A Tüv Süd irá assinar se a Vale adotar as recomendações indicadas na revisão periódica de junho de 2018.”
“Apesar de ter dado esta resposta para Alexandre Campanha, o declarante sentiu a frase proferida pelo mesmo como uma maneira de pressionar o declarante e a Tüv Süd a assinar a declaração de condição de estabilidade sob risco de perderem o contrato”, relatou.
O engenheiro declarou também à PF saber “da existência de uma nascente a montante do reservatório da barragem B1 do CCF e que a água excedente desta nascente corria para dentro da barragem”.
“O declarante não sabe dizer ao certo, mas pode afirmar que desde final de julho/2018 foi construída uma barreira e colocada uma tubulação na nascente para desviar a água do reservatório”, afirmou.
“Em setembro de 2018, na apresentação do relatório de inspeção regular, o declarante solicitou à Vale a construção de um SUMP para que o excedente que extravasasse a barreira e a tubulação colocada na nascente ficasse represado neste local e bombeada para o extravasor.”
À PF, o engenheiro disse ainda que “se o DAM BREAK da barragem B1 mostrou que o refeitório e a sede administrativa estavam no caminho da lama que escorreu após o rompimento, a Vale deveria ter transferido a sede administrativa e o refeitório bem como demais construções para outro local fora do caminho da lama”.
“A Vale informa que vem colaborando proativamente e da forma mais célere possível com todas as autoridades que investigam as causas do rompimento da Barragem I da Mina Córrego do Feijão, em Brumadinho.
Como maior interessada no esclarecimento das causas desse rompimento, além de materiais apreendidos, a Vale entregou voluntariamente documentos e e-mails, no segundo dia útil após o evento, para procuradores da República e delegado da Polícia Federal. A companhia se absterá de fazer comentários sobre particularidades das investigações de forma a preservar a apuração dos fatos pelas autoridades.”
mineradora Vale se recusou a assinar nesta quarta-feira, 6, Termo de Ajuste Preliminar Extrajudicial proposto pelo Ministério Público com ações emergenciais a serem implementadas por conta do rompimento da barragem da mineradora em Brumadinho, na Região Metropolitana de Belo Horizonte.
A empresa alegou precisar de tempo para análise técnica das medidas, conforme informações do promotor André Sterling Prado, que faz parte da força-tarefa que investiga a ruptura da estrutura.
A audiência em que o termo seria assinado ocorreu nesta tarde na 6.ª Vara da Fazenda Pública Estadual e Autarquias da Comarca de Belo Horizonte. Uma nova audiência foi marcada para quinta-feira, 14, segundo o promotor. A empresa, conforme Sterling, recebeu o termo nesta terça, 5. “Foi um prazo curto, realmente, mas nós não admitimos negociação.
A negociação tem que ser em pequenos ajustes, pequenos detalhes. A Vale não tem que questionar isso agora. A Vale tem que simplesmente pagar o que ela causou numa questão emergencial”, disse o representante do MP.
Entre os pontos previstos no termo, que tem 40 cláusulas, está a obrigação da empresa em recompor a arrecadação tributária do Estado de Minas e da prefeitura de Brumadinho pelos próximos três anos, no mínimo, por conta do impacto financeiro nos cofres públicos a ser registrado com rompimento da barragem da empresa no município.
O valor do repasse será calculado com base na média da arrecadação apurada nos últimos 12 meses e independe “de redução de atividade econômica”. A proposta integra a cláusula 13 de um total de 40 reunidas no termo. Outra cláusula estabelece que a empresa apresente em prazo “improrrogável” de 60 dias, “plano de manejo e remoção de rejeitos” que abranja toda a área atingida pela lama que vazou da barragem.
Nesta terça, 5, os rejeitos, que avançam pelo Rio Paraopeba, atingiu a região de Pará de Minas, a cerca de 80 quilômetros de Brumadinho.
Pelo termo, a empresa ficará obrigada a fornecer água para população humana e animais “até o restabelecimento da situação anterior”.
Para o promotor Sterling, a Vale precisa entender a importância da aceitação do documento. “Se na próxima semana esse documento não estiver aceito e construído, acho que aí vai estar caracterizada postura da Vale como empresa que não quer ressarcir os crimes que ela tem cometido”.
Em nota, a mineradora afirmou que “mantém contato com as autoridades de Minas Gerais com o objetivo de buscar soluções consensuais de forma a dar maior celeridade à indenização dos atingidos.”
Na cláusula de número 6 do termo, fica estabelecido que a empresa “obriga-se a adotar todas as medidas necessárias para o estancamento total do carreamento de volume de rejeitos e lama que ainda continuam a vazar das barragens rompidas, inclusive a construir e operar estruturas emergencias de contenção de sedimentos e/ou tratamento sistemas de tratamento in situ de água e dos rejeitos que vazaram das barragens da Mina Córrego do Feijão, de forma a minimizar o impacto associado à continuidade do transporte dos sedimentos para o Rio Paraopeba, seus afluentes ou outros cursos d´água”.
O Rio Paraopeba se junta ao Rio São Francisco no município de Três Marias, que fica, por terra, a 250 quilômetros de Brumadinho. Com o acordo, a Vale também ficaria obrigada a repassar mensalmente à Justiça relatório sobre as medidas que se comprometeu a tomar e resultados alcançados. O termo estabelece também que uma empresa “independente, idônea e reconhecidamente capacitada”, a ser definida por comissão de deliberação, será contratada para elaboração de plano global de recuperação da bacia do rio, com gastos a serem honrados pela mineradora.
Segundo o promotor, na reunião ficou acertado ainda que a mineradora vai repassar imediatamente R$ 13 milhões ao governo de Minas para repor gastos do poder público depois do rompimento da barragem.
“Se isso não ocorresse, as buscas teriam que ser suspensas” disse Sterling.
O trabalho dos bombeiros na região de Brumadinho entraram em seu 13º dia. Por conta das chuvas que atingem a região, o uso de helicópteros é restrito. Segundo o último balanço divulgado pelo Corpo de Bombeiros, o total de mortos é de 150, com 182 desaparecidos. Cerca de 380 integrantes da corporação atuam nas buscas, que contam com o auxílio de máquinas.
Nesta terça, moradores e funcionários da Vale já haviam entrado em atrito em uma reunião realizada no Parque da Cachoeira. Segundo Adilson Lopes Silva, representante dos moradores de Córrego do Feijão, o encontro era para escolher os representantes da comunidade na comissão de vítimas e definir a pauta de reivindicações. “Eles foram de penetra. Não foram convidados. Não era assunto deles. Mas começaram a negar todas os pedidos”, conta.
O morador reclama da falta de representantes da Vale nas comunidades que possam, de fato, ouvir e atender os pedidos das localidades atingidas. “Nas comunidades, só tem funcionário disfarçado de voluntário. Não tem ninguém que possa resolver nada”, diz.
“Saímos preocupados pela lentidão. Estamos observando e atentos para que não se repita o que acontece na bacia do Rio Doce. A reparação deve ter a participação direta, informada e organizada da população atingida”, afirma Joceli Andrioli, da coordenação do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB).
Fonte: Recôncavo Online