Foto: Reprodução/TV Justiça |
A advogada baiana Daniela Lima de Andrade Borges foi repreendida pelo ministro Marco Aurélio durante uma fala no Supremo Tribunal Federal (STF), em Brasília, na quarta-feira (6), após usar o termo "vocês" para se dirigir aos ministros da corte.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) criticou a postura do ministro e, nesta sexta-feira (8), a advogada também se posicionou sobre o caso e disse não ter ficado abalada com a situação.
Daniela Borges, que é presidente da Comissão Nacional da Mulher. Advogada e também é professora da Universidade Federal da Bahia (Ufba) e da Faculdade Baiana de Direito, participou da sessão que julgava recurso extraordinário em que se discutiu a incidência de contribuição previdenciária sobre o salário-maternidade.
Ela defendia a inconstitucionalidade da medida quando foi interrompida pelo ministro após utilizar o pronome “vocês”.
Marco Aurélio defendeu que o correto seria tratá-los por “vossas excelências”.
“Presidente, novamente, advogado se dirige aos integrantes do Tribunal como ‘vocês’? Há de se observar a liturgia. É uma doutora, professora”, repreendeu Mello.
Após ter a fala interrompida, Daniela pediu desculpas e, depois, seguiu com a sustentação.
“Peço desculpas a Vossa Excelência. Talvez pelo nervosismo. O senhor, Vossa Excelência, tem toda a razão. Peço desculpas. É o que posso fazer no momento", destacou a advogada.
Por meio de nota divulgada ao G1 nesta sexta, Daniela Borges disse que, apesar da interrupção do ministro, terminou a sustentação oral com tranquilidade e que cumpriu sua missão.
"Agradeço as inúmeras manifestações de solidariedade e carinho que recebi desde ontem, quando durante minha sustentação no STF fui interrompida pelo eminente Ministro Marco Aurélio, que chamou a atenção para o tratamento dirigido aos membros da Corte. Quero dizer que, para mim, o importante é que ao final cumpri minha missão. Não me abati, terminei a sustentação oral com tranquilidade. O próprio Ministro, ao pedir vista, fez menção a um argumento que levantei e que fez com que ele repensasse seu posicionamento. Portanto, penso que o resultado foi positivo e espero que, ao final, seja declarada a inconstitucionalidade da contribuição previdenciária sobre o salário maternidade, matéria de grande importância para as mulheres".
O G1 entrou em contato com a assessoria de comunicação do STF, para saber se o ministro Marco Aurélio vai se posicionar sobre o caso, e até a última atualização desta reportagem não obteve retorno.
A Ordem dos Advogados do Brasil na Bahia (OAB-BA), por meio de nota, se solidarizou com a advogada, criticou a atitude de Marco Aurélio e disse que a diferenciação de sujeitos, por meio de pronomes de tratamento, representa "nítida herança do regime colonialista brasileiro ainda não superado".
"A linguagem, símbolo de poder e opressão, cuida de colocar em diferentes castas aquele que fala daqueles outros aos quais dirige a palavra, servindo de costura ao esquema de docilidade tão bem referido por Foucault, para a projeção das modernas relações de vassalidade, submissão e obediência. Os sutis, mas não menos violentos, arranjos de poder que traduzem as “corretas” formas de tratamento, mais do que sobrepor a forma ao conteúdo, são responsáveis por garantir a incontestabilidade de seus ditadores, ocultando-lhes, com seus títulos, o vazio de seus significados".
A OAB disse ainda, por meio da nota, que "interromper a palavra da advogada para exigir observância da liturgia é atravessar a voz das cidadãs ali representadas, mais especificamente das mulheres parturientes cujos interesses estavam ali colocados, em gesto notadamente colonialista. O fato demonstra que foi mais palatável ao ministro do STF uma reprimenda primorosamente rebuscada que o respeito insubmisso, o que é apenas um dos muitos sintomas do profundo adoecimento institucional do Estado".
Fonte: G1