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Considerando todo e qualquer esforço no âmbito da gestão municipal para organização da cultura de Muritiba como políticas públicas culturais, desenvolvemos uma breve revisão histórica dos processos, facilmente atestados nas legislações, normativas técnicas e institucionais ao longo dos últimos quartorze anos, obtendo como marco o desmembramento do órgão gestor de cultura da Secretaria de Educação (Lei nº 698/2005) na gestão do Prefeito Roque Luiz Dias dos Santos até a aprovação do Conselho Municipal de Políticas Culturais de Muritiba (Lei nº 1110/2018) na gestão do Prefeito Danilo Marques Sampaio.
A cidade de Muritiba passa a se preocupar especificamente com as políticas culturais conforme preconiza a Constituição Federal de 1988 quando se emancipa da estrutura administrativa da Secretaria de Educação em 2005, organização até então estabelecida na gestão do Prefeito Clementino Pereira Fraga (Lei nº 445/89).
Em 2005, sob a forte influência do Vereador Prof. Paulo José, Presidente da Filarmônica 5 de Março e exímio defensor da cultura municipal, a cidade passa a contar com a Secretaria Mista de Cultura, Desportos e Lazer e cria o seu Conselho de Cultura (Lei nº 739/2006), elegendo a referida personalidade como seu primeiro presidente e o Sr. José Silvano como primeiro secretário da pasta na primeira gestão do Prefeito Roque Luís Dias dos Santos. Na época, o conselho contava com apenas oito representações, sendo elas: Associação da Terceira Idade Grupo Viver Melhor; Associação Filarmônica Lira Popular Muritibana; Associação Educacional e Musical 5 de Março; Comunidade da Educação (Escolas Particulares); e mais quatro representantes do Poder Público Municipal (um do Legislativo e três do Executivo).
Por não representar a diversidade dos segmentos culturais do município, o que tornava a legislação ineficiente aos princípios democráticos e, segundo registros das atas, ter baixo engajamento social, onde suas poucas reuniões estavam quase sempre esvaziadas, o então Conselho de Cultura, cujas demandas culturais se restringiam a organização e realização das festas tradicionais como Festa do Senhor do Bonfim e a Festa de São Pedro, e ao pagamento de subvenções as principais organizações culturais da cidade contempladas na sua própria composição, foi inativado compulsoriamente.
Muritiba perdia seu Conselho de Cultura, ao mesmo tempo em que recebia, em março de 2008, a Biblioteca Municipal Lêda Nair Leal Coelho, reformada do antigo prédio da Escola Reunidas Castro Alves, em parceria com o Governo do Estado da Bahia que doou todo o acervo bibliográfico, contabilizado em aproximadamente sete mil exemplares de literatura brasileira, baiana, enciclopédias e livros infantis.
Em 2009 toma posse o Prefeito Epifânio Marques Sampaio e a Secretaria de Cultura, Desportos e Lazer leva grande período sem nomeação de seu secretário, até ser assumido interinamente pela Secretária de Educação Luciana Dourado em regime acumulativo de cargo. A Secretaria de Cultura é mantida apenas formalmente, já que todos os quadros que atuavam nas demandas esporádicas de grupos culturais e desportivos eram geridos por funcionários da Secretária de Educação e outros órgãos da administração municipal. Observamos, então, uma regressão das políticas culturais municipais que se manteve de 2009 a 2012.
Neste mesmo ano, o museólogo e gestor de cultura Jomar Lima solicitou junto ao Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural da Bahia (IPAC/BA) o tombamento arquitetônico e arquivístico da Igreja Matriz de São Pedro do Monte da Muritiba (processo nº 0607100020183). Em 2014, o IPAC/BA notifica ao Cônego da referida instituição religiosa, Monsenhor José Oliveira Santos, o registro de tombamento provisório, sendo o mesmo obrigado, a partir da data, referir-se à autarquia qualquer intervenção no bem cultural.
Ainda neste período, a sociedade civil se organizou e foram realizadas duas conferências municipais de cultura, organizadas por Jomar Lima e Prof. Jorge Luís nos anos de 2009 e 2011, respectivamente. Essas conferências faziam parte do sistema de conferências estaduais e nacionais e contavam com etapas municipais, regionais, estaduais e nacionais.
Os primeiros delegados estaduais que representaram Muritiba na 3ª Conferência Estadual de Cultura da Bahia na cidade de Ilhéus em 2009, onde foi discutido o tema “Cultura, Diversidade, Cidadania e Desenvolvimento”, foram os artistas e produtores culturais Elomar Gomes e Dayvid Barreto. A cidade não integrou o grupo de delegados nacionais. A segunda delegada estadual que representou Muritiba na 4ª Conferência Estadual de Cultura na Bahia na cidade de Vitória da Conquista em 2011, com o tema “Planejar é Preciso: Consolidação dos Planos de Cultura” foi a cientista social e produtora cultural Láiza Mello. A cidade não integrou o grupo de delegados nacionais.
Importante ressaltar também que houve uma iniciativa dos jovens estudantes universitários Paulo Ricardo Ribeiro, Edgard Abbehusen, Cristiane Marques, Mariana Santos, Vinícius Castro e Vinícius Zacarias na realização do I Encontro de Cultura de Muritiba em 2012 na Câmara Municipal Vereadores.
Em 2013 retorna a gestão do Prefeito Roque Luís Dias dos Santos e a Secretaria de Cultura, Desportos e Lazer passa a ser gerida pela Profa. Ana Cláudia Brandão. No mesmo ano é realizada a 3ª Conferência Municipal de Cultura com forte discurso de valorização da memória cultural do município. Dessa vez, a realização das audiências foi muito mais articulada entre a sociedade civil e o poder público. Como resultado, Vinícius Zacarias foi eleito terceiro delegado estadual, representando Muritiba na V Conferência Estadual de Cultura em Camaçari com o tema “Uma Política de Estado para a Cultura: Desafios do Sistema Estadual de Cultura”, contraditoriamente, neste mesmo período a Biblioteca Municipal é desativada por apresentar más condições infra estruturais (permanecendo fechada até 2016) e os pagamentos às subvenções das organizações culturais é comprometido por inadimplência.
Em 2016 é retomada pela sociedade civil a discussão sobre as políticas culturais, centrando esforços na criação dos Editais Municipais de Cultura. Este movimento foi liderado pelo cientista político Paulo Ricardo Ribeiro, o museólogo Vinícius Zacarias e o cientista social Cláudio Rebouças, culminando na roda de conversa intitulada “Qual é a Cultura de Muritiba?” na sede da Filarmônica Lira Popular Muritibana, onde participaram cerca de vinte agentes locais. Há registro em vídeo publicado nas redes sociais desta atividade.
Em 2017 assume o Prefeito Danilo Marques Sampaio, passando a gerência da Secretaria de Cultura, Desportos e Lazer ao Sr. Luciano de Miranda. É criado em forma de decreto municipal o Programa Escutas Culturais sob responsabilidade técnica do gestor cultural Vinícius Zacarias (Decreto nº 085/2017 e nº 100/2017). O programa previa a realização de três etapas de audiências públicas (tematizadas de Direito de Criar; Direito de Acessar; Direito de Participar) divididas em quatro encontros cada. O programa conseguiu realizar apenas uma etapa em quatro encontros, contando com a parceria institucional do Centro de Cultura, Linguagens e Tecnologias Aplicadas e Pró-reitora de Extensão da Universidade Federal do Recôncavo da Bahia.
Simultaneamente, o município assinou o termo de adesão e compromisso firmado junto ao Governo do Estado (nº 324/2017) comprometendo-se com a implementação do Sistema Municipal de Cultura (Conselho, Plano e Fundo) em até dois anos. Participaram desse processo mais de oitenta agentes culturais do município e toda essa articulação resultou na aprovação da lei do Sistema Municipal de Cultura (Lei nº 1080/2017) e reformulação da vigente lei do Conselho Municipal de Políticas Culturais de Muritiba (Lei nº 1110/2018), ampliando sua representação de oito para vinte e quatro cadeiras. Ambas as legislações foram elaboradas pelo Vereador Paulo Ricardo, a partir das audiências culturais já mencionadas.
Também no ano de 2017 o município iniciou as articulações para a patrimonialização da Festa do Senhor do Bonfim no Livro do Registro Especial de Eventos e Celebrações trazendo à Muritiba para agenda oficial com o Prefeito Danilo Marques Sampaio o Presidente do Instituto do Patrimônio Artístico e Cultural, Sr. João Carlos de Oliveira, e visita técnica da Presidente da Câmara de Patrimônio Cultural do Conselho Estadual de Cultura da Bahia, Sra. Ana Valeska e Sr. Luciano Rocha. Devido a impasses políticos, o encaminhamento dos trâmites legais não foi levado adiante.
Em novembro de 2019 foi realizada uma chamada pública através de Edital (23 de Outubro de 2019. Ano III. Edição n° 136. Caderno 03) para eleição do Conselho Municipal de Políticas Culturais de Muritiba e houve a assembleia para eleição dos novos membros. Em conturbada plenária foram eleitos o gestor cultural Vinícius Zacarias, representando o segmento de pesquisa e literatura, para o cargo de Presidente; o músico Ovídio Júnior, representando a Fanfarra do Colégio Estadual João Batista Pereira Fraga, para o cargo de vice-presidente; e Anamélia Rocha, representando o segmento de artes cênicas, como primeira-secretária. Alegando irregularidades na condução do processo eleitoral, a gestão municipal não nomeou os conselheiros e a posse não ocorreu.
Constatamos com essa recuperação histórica que as políticas culturais de Muritiba, embora sendo insipientes em muitos aspectos de profissionalização técnica e organização política, sempre estiveram presente nos esforços de notáveis contribuintes municipais das boas práticas democráticas que acreditaram na cultura como vetor de fortalecimento identitário, desenvolvimento econômico e autonomia cidadã na cidade.
Finalizamos este pequeno artigo homenageando in memoriam três das grandes personalidades da cultura de nosso município: o honroso professor Paulo José e o inigualável artista Jair do Mente Livre, ambos colaboradores da 1ª Conferência de Cultura de Muritiba e da 3ª Conferência de Cultura de Muritiba, respectivamente, e o Mestre Avelino, grande expoente da cultura popular que partiu recentemente, deixando-nos seu legado de resistência e amor ao samba de roda. Em nome deles e de todos os fazedores e fazedoras de cultura de Muritiba, honremos nossos passos que vieram de longe.
Vinícius Zacarias e Anamélia Rocha - Ativistas Culturais de Muritiba