Embalo de reflexões: Mais respeito para os fazedores da cultura!

"Eu me curvo diante daqueles que vieram antes de mim. Tomo a bênção aos meus mais velhos para ser abençoado nesta vida", Yalle Tárique.

Foto: Seu Zé
Por Alzira Costa*
Há dez anos, morria o ativista cultural cachoeirano Paulo Cruz, idealizador da Fundação Cultural Maria América Cruz. Ele foi presença ativa na cena cultural da cidade. Por meio da sua fundação, imprimia e divulgava gratuitanente folhetos com as respectivas programações de eventos religiosos e civis de Cachoeira, além de outras ações em defesa do patrimônio material e imaterial da cidade.

Paulo promovia diálogos e articulações com representantes de órgãos públicos em busca de apoios para as manifestações populares do município, e a preservação do seu patrimônio artístico e arquitetônico.

Com esse olhar, Paulo Cruz foi pioneiro nas iniciativas e discussões para propor ao Governo do Estado o tombamento da Festa de Nossa Senhora da Ajuda como patrimônio cultural e imaterial da Bahia. Nessa caminhada contou com a parceria e apoio sério de conterrâneos e conterrâneas em defesa da salvaguarda da festa.

Paulo havia sido juiz da festa, antes do financiamento oficial com dinheiro público. No dia da sua repentina morte, 17 de novembro de 2014, estava em Cachoeira, preparando-se para participar da festa como fizera durante grande parte da sua existência.

Mesmo triste e decepcionado, como desabafara para amigos, dias antes de sua morte, com os rumos que as comemorações em louvor à santa estavam tomando. 

Paulo Cruz queixou-se que, praticamente, havia sido excluído dos preparativos e reuniões para a realização da festa, por pessoas, segundo seus amigos, que tomaram para si todo o controle do evento, cuja história sempre foi marcada pela participação livre e democrática de todos os segmentos da população.

Os anos se passaram após a sua morte, e Cachoeira presenciou a tentativa de apagar a memória do falecido Balainho, filho do saudoso músico Balaio, saxofonista da Minerva Cachoeirana, e animado integrante da famosa charanga da Ajuda. Balaio ao lado de outros músicos de sua geração, ao exemplo de Seu Luiz da Cruz, Cassimiro, Seu João Ribeiro, Xendengue e tantos mais, eram a própria festa.

Do pai, Balainho herdou o dom musical, a alegria contagiante e o amor pela Ajuda. Em vida, foi discriminado e perseguido pelos novos donos dos festejos. Pós morte, seus companheiros músicos foram impedidos de homenagar a sua memória durante a festa deste ano.

As perseguições não têm poupado ninguém, de acordo com fatos recentes, reconhecida internacionalmente por sua participação na vida cultural de Cachoeira, Dona Dalva do Samba de Roda e fundadora do Terno do Acarajé, há dois anos sofre retaliações para não participar da festa. Mas sua força tem superado toda perversidade e este ano o terno saiu.

Anos antes de falecer, Paulo Cruz participou da festa com uma fantasia "Que Rei Sou Eu?". Era uma indagação irônica.

Os fatos lamentáveis registrados nesse novo momento da Festa da Ajuda, talvez seja uma resposta ao que o devoto e folião Paulo questionava de modo lúdico.

Que reinado é esse, que pisa na história e na memória daqueles que fizeram e fazem os Louvores da Ajuda acontecerem?

"A Capela D'Ajuda já deu o sinal. Levanta a máscara, careta!"

*Alzira Costa é jornalista, moradora de Cachoeira, no Recôncavo Baiano.

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